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sexta-feira, 10 de outubro de 2014

DECÁLOGO: EPISÓDIO V - KRZYSZTOF KIESLOWSKI

A pena de morte é um assunto polêmico em qualquer sociedade. Mas a discussão ainda parece longe de ser conduzida de maneira holística e sensata, isto é, analisando os contextos sociais da criminalidade, e isenta de sentimentalismos revanchistas e justiceiros daqueles que defendem a punição capital. O confronto direto entre a brutalidade de um crime decidido pela lei e outro cometido por um indivíduo coloca a bestialidade humana no centro dessa discussão e revela o modelo arcaico de se punir a violência por meio da própria violência. A questão não envolve apenas um sistema de justiça que valoriza e prefere a retribuição em vez da reabilitação, mas encerra-se numa visão materialista de que a morte física basta para eliminar o mal, expurgar aqueles que seguem na contramão da construção social e representam uma ameaça às sociedades.


Quando atos são julgados pelas suas consequências e desprezamos a razão pela qual eles foram cometidos, invariavelmente, descartamos qualquer possibilidade de entendê-los com o interesse numa solução de tratamento ou, simplesmente, em encontrar uma maneira humanamente exemplar de lidar com o problema. Ou seja, eliminamos o problema sem o discernimento necessário para compreendê-lo diante da incapacidade de resolvê-lo. Em suma, o homem responde a esse problema com a violência porque tanto o justo quanto o injusto, nesse caso, não conhece outra forma de expressão do seu pensamento. O primeiro mata por índole ou fraqueza enquanto o segundo mata com o respaldo da lei.


Baseado na mandamento "não matarás", Kieslowski não parece emitir qualquer julgamento neste quinto episódio de Decálogo ao criar o cenário perturbador de um crime hediondo, cometido por um jovem que, a princípio, parece apenas vagar sem ter o que fazer. Aos poucos sabemos que ele, na verdade, está ocupado em fomentar alguma forma de expressão para as suas angústias interiores. Após o crime, conhecemos a sua história, percebemos as suas fraquezas, a sua incompetência para lidar com as suas tristezas e, sobretudo, a razão da sua transformação pessoal, de um jovem pacato e tranquilo do interior para o criminoso que caminha para a morte. Nesse ponto, Kieslowski levanta a questão do ser humano no centro do problema e ao fazer crescer o lado humano constrói uma realidade na qual a humanidade padece no esquecimento do seu lado prático.

Decálogo V não nos coloca diante apenas da questão da pena de morte, mas além dela, no centro da questão das penas da vida, quando o verbo ainda está muito distante dos valores fundamentais para uma sociedade realmente sadia na prática, quando a religião não basta para entender o ser humano e suas falhas e os princípios, sejam eles quais forem, ainda se curvam diante das emoções em detrimento da razão.

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